Fernando António Nogueira Pessoa (Lisboa, 13 de Junho de 1888 – Lisboa, 30 de Novembro de 1935), mais conhecido como Fernando Pessoa, foi um poeta e escritor português. É considerado um dos maiores poetas da Língua Portuguesa, e da Literatura Universal, muitas vezes comparado com Luís de Camões. O crítico literário Harold Bloom [1] considerou a sua obra um “legado da língua portuguesa ao mundo”. Por ter crescido na África do Sul, para onde foi aos seis anos em virtude do casamento de sua mãe, Pessoa aprendeu a língua inglesa. Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa. Fernando Pessoa dedicou-se também a traduções deste idioma. Ao longo da vida trabalhou em várias firmas como correspondente comercial. Foi também empresário, editor, crítico literário, activista político, tradutor, jornalista, inventor, publicitário e publicista, ao mesmo tempo que produzia a sua obra literária. Como poeta, desdobrou-se em múltiplas personalidades conhecidas como heterónimos, objecto da maior parte dos estudos sobre a sua vida e a sua obra. Centro irradiador da heteronímia, auto-denominou-se um “drama em gente”.
Fernando Pessoa morreu de cirrose hepática aos 47 anos, na cidade onde nasceu. A sua última frase foi escrita em Inglês: “I know not what tomorrow will bring… “ (“Não sei o que o amanhã trará”).
Heterónimos
Heteronímia (heteros = diferente; + ónoma = nome) é o estudo dos heterónimos, isto é, estudo de autores fictícios (ou pseudo-autores) que possuem personalidade. Ao contrário de pseudónimos, os heterónimos constituem uma personalidade. O criador do heterónimo é chamado de “ortónimo” [2]. O maior e mais famoso exemplo da produção de heterónimos é do poeta português Fernando Pessoa, criador de Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro, além de outros de menor importância e do semi-heterónimo Bernardo Soares. Sendo assim, quando o autor assume outras personalidades como se fossem pessoas reais.
Álvaro de Campos
Entre todos os heterónimos, Campos foi o único a manifestar fases poéticas diferentes ao longo da sua obra. Era um engenheiro de educação inglesa e origem portuguesa, mas sempre com a sensação de ser um estrangeiro em qualquer parte do mundo. Começa a sua trajectória como um decadentista [3] (influenciado pelo simbolismo [4]), mas logo adere ao futurismo [5]. Após uma série de desilusões com a existência, assume uma veia niilista [6], expressa naquele que é considerado um dos poemas mais conhecidos e influentes da língua portuguesa, Tabacaria. É revoltado e crítico e faz a apologia da velocidade e da vida moderna, com uma linguagem livre, radical.
Ricardo Reis
O heterónimo Ricardo Reis é descrito como um médico que se definia como latinista [7] e monárquico. De certa maneira, simboliza a herança clássica na literatura ocidental, expressa na simetria, na harmonia e num certo bucolismo [8], com elementos epicuristas [9] e estóicos [10]. O fim inexorável de todos os seres vivos é uma constante na sua obra, clássica, depurada e disciplinada. Faz uso da mitologia não-cristã. Segundo Pessoa, Reis mudou-se para o Brasil em protesto à proclamação da República em Portugal e não se sabe o ano da sua morte. Em O ano da morte de Ricardo Reis, José Saramago [11] continua, numa perspectiva pessoal, o universo deste heterónimo após a morte de Fernando Pessoa, cujo fantasma estabelece um diálogo com o seu heterónimo, sobrevivente ao criador.
Alberto Caeiro
Por sua vez, Caeiro, nascido em Lisboa, teria vivido quase toda a vida como camponês, quase sem estudos formais. Teve apenas a instrução primária, mas é considerado o mestre entre os heterónimos (pelo ortónimo). Após a morte do pai e da mãe, permaneceu em casa com uma tia-avó, vivendo de modestos rendimentos. Morreu de tuberculose. Também é conhecido como o poeta- filósofo, mas rejeitava este título e pregava uma “não-filosofia”. Acreditava que os seres simplesmente são, e nada mais: irritava-se com a metafísica [12] e qualquer tipo de simbologia para a vida.
Nos escritos pessoanos que versam sobre a caracterização dos heterónimos, Pessoa, dito “ele mesmo”, assim como a Álvaro de Campos, Ricardo Reis e o meio-heterónimo Bernardo Soares, conferem a Alberto Caeiro um papel quase místico enquanto poeta e pensador. Reis e Soares chegam a compará-lo ao deus Pã, e Pessoa esboça-lhe um horóscopo no qual lhe atribui o signo de leão, associado ao elemento fogo. A relevância destas alusões se esclarece na explicação de Fernando Pessoa sobre o papel de Caeiro no escopo da heteronímia. Citando a actuação dos quatro elementos da astrologia [13] sobre a personalidade dos indivíduos, Pessoa escreve:
“Uns agem sobre os homens como o fogo, que queima nele todo o acidental, e os deixa nus e reais, próprios e verídicos, e estes são os libertadores. Caeiro é desta raça. Caeiro teve esta força.”
Dos principais heterónimos de Fernando Pessoa, Caeiro foi o único a não escrever em prosa. Alegava que somente a poesia seria capaz de dar conta da realidade. Possuía uma linguagem estética directa, concreta e simples mas, ainda assim, bastante complexa do ponto de vista reflexivo. O seu ideário resume-se no verso Há metafísica bastante em não pensar em nada. A sua obra está agrupada na colectânea Poemas Completos de Alberto Caeiro.
Fernando Pessoa e a Maçonaria
Conforme (Bondarik, 2011) um daqueles que primeiro saiu e actuou em defesa da Arte Real, foi Fernando Pessoa, um escritor dotado de uma qualidade que, a nós na actualidade, se apresenta de uma maneira praticamente indiscutível. Em quatro de Fevereiro de 1935, ele publicou no jornal “Diário de Lisboa”, um artigo muito instrutivo, reflexivo, também em certos aspectos bastante que provocativo e ao mesmo tempo escrito de uma forma que o tornou muito agradável de ler.

Fernando Pessoa
Intitulado “As Associações Secretas – Análise Serena e Minuciosa a um Projecto de Lei apresentado ao Parlamento“, quando da sua primeira edição , neste trabalho Fernando Pessoa realizou a defesa do direito de existência e de actuação das associações que eram tidas como secretas. Em especial procurou defender o direito de existência e esclareceu bastante a actuação da Maçonaria ao longo do tempo, tanto em Portugal como no restante do Mundo, procurou também estabelecer os laços de fraternidade que mantém unidos todos os seus membros pelo mundo afora através dos tempos. Usando as suas muitas habilidades superiormente desenvolvidas de escritor, aliadas à sua incomum inteligência, o seu finíssimo e refinado humor somadas a uma intencional e subtil ironia, Fernando Pessoa desfiou pelas linhas e parágrafos do artigo, uma série de argumentos racionais contra a aprovação da já referida lei. Ao mesmo tempo em que procurava sempre repassar importantes informações sobre a Maçonaria, os seus princípios e a sua importância. Fernando Pessoa faz ainda ataques, alguns deles subtis outros muito directos e objectivos à chamada anti-maçonaria e aos seus representantes. Fernando Pessoa destaca dentro da anti-maçonaria a ignorância , que é cultivada sobre os assuntos relacionados a Maçonaria, como o factor que liga profundamente aqueles que agem como anti-maçons e se consideram os combates de uma Cruzada sagrada contra a Maçonaria e o universo dos maçons. É dentro deste rol de pseudos e sagrados combatentes da Maçonaria e defensores da fé cristã, que Fernando Pessoa coloca o deputado José Cabral, já referido como o autor do projecto de proibição e combate as sociedades e associações secretas.
“(…) como a maioria dos anti-maçons, o autor deste projecto é totalmente desconhecedor do assunto Maçonaria. O que sabe dele é até, porventura, pior que nada, pois, naturalmente, terá nutrido o seu anti-maçonismo da leitura da imprensa chamada católica, onde, até nas coisas mais elementares da matéria, erros se acumulam sobre erros, e aos erros se junta, com a má vontade, a mentira e a calúnia, senhoras suas filhas. (…)” (PESSOA, Passim).
Se Fernando Pessoa ainda estivesse vivo e actuante, conforme o seu estilo neste início de Terceiro Milénio, com certeza hoje substituiria a referência que fez a virulência da imprensa portuguesa que se denominava de católica, daquele já longínquo ano de 1935, por uma outra que levasse em conta as diversas publicações existentes dos supostos e pseudos pregadores evangélicos. Levaria em conta também, com toda a certeza, os sites e os textos disponíveis e existentes na internet, que já se apresentam de forma incontável. Textos e sites estes que dedicam o seu tempo e o seu espaço a fazer ataques gratuitos a Maçonaria e aos maçons. Existe nos nossos dias um consenso entre alguns fundamentalistas religiosos, muitos deles neo-pentencostais, de que a maçonaria representa uma ameaça ao cristianismo e também as suas ideias messiânicas e apocalípticas. Estes ataques se realizam na maioria das vezes de forma raivosa e gratuita, conforme já afirmado, pois a Maçonaria nunca desejou destruir e nem mesmo ocupar o lugar que pertence ao cristianismo na cultura da Civilização Ocidental. Afirmamos aqui e sempre que for necessário, de uma forma segura e tranquila, conforme aquilo o que nos é colocado por José Castellani [14], que de maneira alguma a Maçonaria se apresenta ou algum dia procurou se apresentar como uma religião, ou pretensa substituta de alguma religião. Isto pode ser afirmado apesar da Maçonaria também fazer uso de uma linguagem simbólica. Um simbolismo que na maioria das vezes pode ser próprio da religião, em especial da Igreja Católica. Tal particularidade tem levados a muitos daqueles que são desconhecedores dos princípios e das práticas da Ordem Maçónica, a imaginá-la e a representa-la como sendo uma religião . Tal condição e situações, tem levado até mesmo a alguns maçons menos esclarecidos e informados a idealizarem a Maçonaria como sendo uma religião perfeita, para eles a mais antiga, perfeita e justa de todas elas:
“(…) Embora a Maçonaria não seja uma religião e nem seja uma ordem mística, ela utiliza, nos seus rituais, na sua simbologia e na sua estrutura filosófica e doutrinária, os padrões místicos de diversas seitas, associações e civilizações antigas, principalmente os relativos às religiões e às ordens iniciáticas de cunho religioso daqueles povos que representaram o alvorecer das civilizações e que representam o alvorecer das civilizações e que concentravam, desde o século V a. C., em torno dos rios Tigre e Eufrates e do Mar Mediterrâneo. (…) [A Ordem Maçónica] nascida na sua forma moderna, nas asas das aspirações liberais e libertárias dos povos subjugados pelo poder real absoluto e pelos privilégios do clero, ela, também, é liberal e libertária, evolutiva e adaptável às épocas, racional e democrática. Para armar todavia, a sua doutrina moral, ela buscou o simbolismo nascido da mística de civilizações perdidas na noite dos tempos; e o simbolismo, fonte de espiritualidade oculta, será, sempre, por mais que a cibernética e a materialidade dominem o mundo, uma LUZ no caminho da humanidade (…)” (Castellani: 1996. p.92).
Um outro ponto essencial e muito importante, que torna o artigo de Fernando Pessoa envolvente e ao mesmo tempo extremamente interessante para a Ordem Maçónica e que deve, portanto ser bem explanado, é o facto de que ele por diversas vezes tenha se declarado como um não iniciado na Maçonaria, ou seja como ele afirmava sobre si mesmo, um não Maçom. Fernando Pessoa destaca, porém a sua grande admiração e o seu profundo respeito pela Ordem, porém não se cansa de afirmar também a imensa dificuldade encontrada por aqueles que não são iniciados nos seus augustos mistérios, para poder estudar, procurar compreender e atingir um nível de conhecimento e entendimento razoáveis sobre a Maçonaria:
“(…) Não sou Maçom, nem pertenço a qualquer outra Ordem semelhante ou diferente. Não sou, porém, anti-maçom, pois o que sei do assunto me leva a ter uma ideia absolutamente favorável da Ordem Maçónica. A estas duas circunstâncias, que em certo modo me habilitam a poder ser imparcial na matéria, acresce a de que, por virtude de certos estudos meus, cuja natureza confina com a parte oculta da Maçonaria – parte que nada tem de político ou social -, fui necessariamente levado a estudar também este assunto – assunto muito belo, mas muito difícil, sobretudo para quem o estuda de fora (…)” (Pessoa, op. cit.).

Luís Miguel Nogueira Rosa Dias, sobrinho de Fernando Pessoa, Maçom, que se dedicou a estudar e a dar palestras sobre o seu tio. Passou ao Oriente Eterno em 30 de Agosto de 2019. Era membro da R∴ L∴ Mestre Affonso Domingues, nº 5, que integra a Grande Loja Legal de Portugal / GLRP
Conforme (Bondarik, 2011) Por meio de informações diversas que chegaram ao seu conhecimento, existe uma possibilidade que tem sido bastante considerada sobre o facto de que Fernando Pessoa tenha pertencido à Ordem Rosa-Cruz [15]. O que é certo, porém, e que ele próprio também afirmou, ainda em 1935, ao procurar fazer uma definição da sua personalidade, que pertencia a Ordem dos Cavaleiros Templários. Apesar dele não o afirmar de maneira directa e objectiva, é possível que ele tenha também pertencido a algumas outras ordens ou grupamentos místicos ou esotéricos, pois é isso que ele nos faz entender por diversas vezes:
“(…) Tendo eu, porém, certa preparação, cuja natureza me não proponho indicar, pude ir, embora lentamente, compreendendo o que lia e sabendo meditar o que compreendia. Posso hoje dizer, sem que use de excesso de vaidade, que pouca gente haverá, fora da Maçonaria, aqui ou em qualquer outra parte, que tanto tenha conseguido entranhar-se na alma daquela vida, portanto e derivadamente, nos seus aspectos por assim dizer externos (…)” (Idem)
Segundo o mesmo autor, as informações anteriormente citadas foram feitas, com certeza, no intuito de demonstrar àqueles que possuíam sentimentos contrários à Maçonaria, que ele possuía conhecimentos suficientes sobre a Ordem. Um conjunto de conhecimentos que no seu julgamento e no seu íntimo o habilitavam e lhe davam uma autoridade intelectual, que ele julgava ímpar, para actuar como um defensor consciente da Maçonaria. Para que Fernando Pessoa tivesse a segurança necessária nas suas afirmações, e também com o possível intuito de tentar evitar as futuras com certeza graves complicações junto ao governo português, imaginamos também, que ele tenha procurado se valer e destacar o facto de que não era Maçom. É possível pensarmos que ao afirmar tal condição, ele já estivesse procurando se precaver de eventuais e prováveis represálias directas do Estado, que conforme já afirmamos estava já configurado na prática como uma ditadura que não respeitava os direitos individuais dos cidadãos.
Continuando com a sua defesa e a apologia que fez da Maçonaria, Fernando Pessoa coloca sobre um erro grave e que muitos dos anti-maçons comungariam da sua prática, o facto deles considerarem ser a Maçonaria simplesmente uma associação secreta. Nas suas afirmações, a Maçonaria seria, isto sim, uma Ordem Secreta. Afirmando isto em melhores palavras, Fernando Pessoa considerava a Maçonaria como sendo uma Ordem Iniciática [16] (Bondarik, 2011).
“(…) A Ordem Maçónica é secreta por uma razão directa e derivada – a mesma razão por que eram secretos os Mistérios antigos, incluindo os dos primitivos cristãos, que se reuniam em segredo, para louvar a Deus, em o que hoje se chamariam Lojas ou Capítulos, e que, para se distinguir dos profanos, tinham fórmulas de reconhecimento – toques, ou palavras de passe, ou o que quer que fosse. por este motivo os romanos lhes chamavam ateus, inimigos da sociedade e inimigos do Império – precisamente os mesmos termos com que hoje os maçons são brindados pelos sequazes da Igreja Romana, filha, talvez ilegítima, daquela maçonaria remota. (…)” (Idem).
Ainda sobre o facto de muitos dos supostos entendidos, considerarem a Maçonaria como sendo uma Ordem Secreta, o escritor Curtis Masil, coloca-nos uma série de ponderações e afirmativas:
“(…) Na verdade não há propriamente sociedades secretas hoje em dia. O que há, quando muito, são organizações que comungam uma doutrina comum, exigindo dos seus membros filiados certos compromissos para mantê-la sempre activa, como se fora a chama acesa, erguida ao alto por muitas mãos, todas elas zelando para que o vento das hipocrisias humanas não apague jamais. Se o leitor prestar atenção verá que todas as grandes religiões do mundo, como a católica e a Judaica, possuem dois círculos: um externo, que é para o povo em geral; e o outro, interno, para o seu corpo de sacerdotes e rabinos, onde, de um lado, uns ouvem e aprendem, enquanto do outro lado há os que estudam e ensinam. Jesus Cristo, e este é apenas um exemplo, discutia com os seus Apóstolos. Mas o que lê ensinava àqueles Apóstolos, salvo o Alto Colégio da Cúria romana, talvez a sua congénere judaica, ninguém ficou sabendo até os dias de hoje (…)” (MASIL, 1986, p.13).
Um outro pensador Maçom, Erwin Seignemartin [17], numa conferência que foi realizada em 1979, também chegou a tecer algumas considerações importantes sobre o facto da Maçonaria não poder ser considerada como uma sociedade secreta. Erwin Seignemartin ponderou também, sobre aqueles que seriam os diversos objectivos e os propósitos da Ordem Maçónica e também sobre os segredos que devem ser guardados pelos maçons. Ele coloca que praticamente todo o conteúdo da Maçonaria esta acessível a qualquer pessoa que se predisponha a pesquisar numa livraria ou biblioteca. Podemos colocar ainda que na actualidade os meios de pesquisa se avolumaram quase que ao extremo da facilidade e da obtenção de informações. Praticamente qualquer assunto sobre a Maçonaria pode ser encontrado em sites da internet:
“(…) A Maçonaria não é uma sociedade secreta, no sentido como tal termo é geralmente empregado. Uma sociedade secreta é aquela que tem objectivos secretos e oculta a sua existência assim como as datas e locais das suas sessões. O objectivo e propósito da Maçonaria, as suas leis, história e filosofia tem sido divulgados em livros que estão a venda em qualquer livraria. Os únicos segredos que a maçonaria conserva são as cerimónias empregadas na admissão dos seus membros e os meios usados pelos Maçons para se conhecerem (…)” (Seignemartin, 1979, passim)
Alertando sobre as consequências que poderiam decorrer das às intenções do Deputado José Cabral e as dos seus aliados em tornar fora-da-lei a Maçonaria, Fernando Pessoa advertiu que as Sociedades Iniciáticas estão defendidas por condições e forças que podem ser consideradas especiais. Condições especiais estas que as tornam as Sociedades Iniciáticas praticamente indestrutíveis por forças que por ventura se avolumem e actuem contra elas a partir do exterior destas sociedades.
Sobre as acções praticadas contra a Maçonaria naquela época (1935), pelas inúmeras ditaduras que existiam na Europa – Hitler na Alemanha, Rivera [18] na Espanha, Mussolini na Itália, Stalin na União Soviética – Fernando Pessoa coloca-nos um dúvida sobre o carácter eficaz dessas medidas autoritárias. Destaca também a sua crença na acção da Maçonaria para colocar fim aos diversos regimes despóticos que tinha listado.
O artigo escrito por Fernando Pessoa, “As Associações Secretas – Análise Serena e Minuciosa a um Projecto de Lei apresentado ao Parlamento”, não deve ser considerado apenas uma defesa da Ordem Maçónica. Ele também é, acima e antes de qualquer outra consideração, uma defesa profunda daqueles ideais que são considerados democráticos. O artigo apresenta uma defesa de forma clara da prática da democracia, uma defesa bastante profunda e fundamentada das liberdades civis e individuais. “(…) Neste artigo Fernando Pessoa também faz a defesa da liberdade de pensamento, de expressão e de livre reunião (…)” (Varella, 2004, passim). Fernando Pessoa praticamente fez, de forma directa, clara e aberta um alerta a todos que pudessem e quisessem ouvir, contra a ameaça da ditadura cada vez mais opressora que se solidificava e se tomava consistência em Portugal.
(…)
(E) foi então que, para te vingar
E à maneira de santo, os arreliar
Desceste mansamente à terra
Perfeitamente disfarçado
E fizeste entre os homens da razão
Um milagre assignado,
mas cuja assignatura se erra
Quando em teu dia, S. João do Verão,
Fundaste a Grande Loja de Inglaterra.
Isto agora é que é bom,
Se bem que vagamente rocambólico.
Eu a julgar-te até catholico,
E tu sahes-me maçon.
Bem, ahi é que ha espaço para tudo,
Para o bem temporal do mundo vario.
Que o teu sorriso doure quanto estudo
E o teu Cordeiro
Me faça sempre justo e verdadeiro,
Prompto a fazer fallar o coração
Alto e bom som
Contra todas as fórmulas do mal,
Contra tudo que torna o homem precário.
Se és maçon,
Sou mais do que maçon – eu sou templário.
Esqueço-te santo
Deslembro o teu indefinido encanto.
Meu Irmão, dou-te o abraço fraternal.
Fernando Pessoa
Últimas Estrofes do Poema S. João (1935)
(recolhido por Alfredo Margarido [19])
O poema a seguir aborda a Maçonaria em palavras de Fernando Pessoa.
O Verdadeiro Segredo Maçónico
O verdadeiro Segredo Maçónico…
É um segredo de vida
e não de ritual
e do que se lhe relaciona.
Os Graus Maçónicos comunicam àqueles que os recebem,
sabendo como recebe-los,
um certo espírito,
uma certa aceleração da vida
do entendimento
e da intuição,
que atua como uma espécie
de chave mágica dos próprios símbolos,
e dos símbolos
e rituais não maçónicos,
e da própria vida.
É um espírito,
um sopro posto na Alma,
e, por conseguinte,
pela sua natureza,
…incomunicável.
Fernando Pessoa
Roberto Aguilar M. S. Silva – A∴R∴L∴S∴ Sentinela da Fronteira, Corumbá, MS – Academia Maçónica de Letras de Mato Grosso do Sul – Brasil
Notas
[1] Harold Bloom (Nova Iorque, 11 de Julho de 1930) é um professor e crítico literário norte-americano. O professor ficou conhecido como um humanista porque sempre defendeu os poetas românticos do século XIX, mesmo num tempo em que as suas reputações eram muito baixas.
[2] Ortónimo é o nome que corresponde ao autor efectivo da obra quando um escritor assina os seus trabalhos sob pseudónimo (pseudónimo, no Brasil) ou heterónimo (heterónimo, no Brasil) – ou seja, o autor que teve existência real. Na coexistência, enquanto o ortónimo comparece como o criador, aos heterónimos cabe-lhes tão-só o papel de as criaturas, por mais verossímeis possam ser. Por exemplo, o autor efectivo ou real Fernando Pessoa criou vários heterónimos, cada um com a sua própria individualidade definida, e sob cada um deles produziu vasta obra, cada qual com feição específica. Porém — no domínio de Fernando Pessoa — ao se falar de ortónimo, quer-se referir apenas a Fernando Pessoa, ele mesmo, com exclusão, portanto, do que for atribuído especificamente aos seus heterónimos. Fernando Pessoa (criador) é, pois, o ortónimo de Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Bernardo Soares e Ricardo Reis – todos criaturas suas. Vale, entretanto, considerar-se que esta nomenclatura nunca foi utilizada pelo próprio Fernando Pessoa, que julgava-se a si mesmo um heterónimo. Reunidos sob o título “Justificação da Heteronímia”, assim como em famosa carta a Adolfo de Casais Monteiro, vários escritos de Pessoa descrevem a heteronímia como um processo da sua despersonalização. Assim, o termo “ortónimo”, parece servir mais a uma classificação dos seus estudiosos.
[3] Esta palavra designa uma corrente literária que se manifesta principalmente depois de 1880 e se prolonga, em Portugal, até à década de 1920. Liga-se ao cansaço duma civilização que se julga estar no ocaso, ao tédio, à busca de sensações novas, mais intensas, fruídas no extravagante, no mórbido, nos requintes da forma. Trata-se, pois, dum esteticismo que tem estreitas relações com o simbolismo e o impressionismo, produtos da mesma atmosfera sócio-cultural. Usa-se o adjectivo decadente no sentido de decadentista (ou decadista), daí a frase de Álvaro de Campos numa carta inserta na revista Contemporânea em 1922 (n. 4): «Fui em tempos poeta decadente (alusão ao «Opiário»); hoje creio que estou decadente, e já o não sou». […] Com efeito, em poetas portugueses influenciados por Baudelaire já antes de 1880 se descobre uma tendência decadentista […] o artista decadente sucumbia à sedução do anti-vital por sentir exausta a força criadora; evadia-se para o mundo da imaginação sensual, entretinha a nevrose com fantasias deliquescentes e preciosismos fúteis. Em fins do século XIX o termo decadência ocorre a cada passo. Osório de Castro fala em 1889 do «isolamento altivo dos artistas deste século que morre»; Raul Brandão, que pertence, por 1891-2, ao «Cenáculo» portuense dos «nefelibatas» (com Alberto de Oliveira, D. João de Castro, António Nobre, etc.), dá-nos na História dum Palhaço (1896) a imagem duma época em que, perdidas a fé cristã e a fé na ciência, «a asa do sonho outra vez toca os espíritos» e em que nascem «criaturas singulares, aberrações infinitas, curiosos cérebros cheios de sonho»; também ele reconhece «a agonia do século». O simbolismo de Eugénio de Castro tem muito de decadentista, pela estranheza dos motivos, neologismos, palavras raras e combinações fónicas; o decorativo da liturgia, a «medievalite», a evocação luxuosa de ambientes orientais, a sensualidade perversa de Salomé – eis outros aspectos característicos. […]
[4] Entende-se aqui por Simbolismo, não o conjunto de manifestações espiritualistas do último quartel do séc. XIX e o primeiro quartel do séc. XX (como têm entendido alguns), mas, num sentido mais especificamente histórico-literário, uma escola ou corrente poética (incluindo a poesia em prosa e a poesia teatral), que se afirma sobretudo entre 1890 e 1915 e que se define por um conjunto de aspectos, aliás variáveis de autor para autor, que dizem respeito às atitudes perante a vida, à concepção da arte literária, aos motivos e ao estilo. Sem dúvida esta corrente literária insere-se na atmosfera mental, anti-positivista, de fins do séc. XIX; mas certos caracteres de técnica literária, de forma, são inerentes ao conceito de Simbolismo aqui adoptado. Entretanto, há ainda um conceito mais restrito: o daqueles que, tomando como pontos de referência paradigmáticos Mallarmé e Claudel, definem o Simbolismo pela busca obstinada duma verdade metafísica, demanda cujo instrumento de descoberta seria o símbolo. Com efeito, se teimássemos em definir o Simbolismo tão-só pela visão do Universo como teia de analogias, floresta de misteriosas «correspondências» (na acepção baudelairiana) que o poeta se propõe desvendar, então não teria havido Simbolismo autêntico em Portugal: os poetas portugueses dessa época ter-se-iam limitado a copiar grosseiramente gestos cujo sentido profundo não alcançavam. Mas os próprios autores considerados representantes do Simbolismo francês, de que o nosso deriva (Baudelaire, Rimbaud, Verlaine, Mallarmé, Laforgue, Régnier, A. Samain, Valéry, etc.), seguiram caminhos divergentes, a ponto de Johansen afirmar que discordavam uns dos outros em quase tudo excepto quanto à existência dum ideal em poesia e na aguda consciência do estilo.
[5] O futurismo é um movimento artístico e literário, que surgiu oficialmente em 20 de Fevereiro de 1909 com a publicação do Manifesto Futurista, pelo poeta italiano Filippo Marinetti, no jornal francês Le Figaro. Os adeptos do movimento rejeitavam o moralismo e o passado, e as suas obras baseavam-se fortemente na velocidade e nos desenvolvimentos tecnológicos do final do século XIX. Os primeiros futuristas europeus também exaltavam a guerra e a violência. O Futurismo desenvolveu-se em todas as artes e influenciou diversos artistas que depois fundaram outros movimentos modernistas.
[6] Niilismo (do latim nihil, nada) é um termo e um conceito filosófico que afecta as mais diferentes esferas do mundo contemporâneo (literatura, arte, ciências humanas, teorias sociais, ética e moral). É a desvalorização e a morte do sentido, a ausência de finalidade e de resposta ao “porquê”. Os valores tradicionais depreciam-se e os “princípios e critérios absolutos dissolvem-se”. “Tudo é sacudido, posto radicalmente em discussão. A superfície, antes congelada, das verdades e dos valores tradicionais está despedaçada e torna-se difícil prosseguir no caminho, avistar um ancoradouro”.
[7] s.m. e s.f. Pessoa versada na língua e na literatura latinas.
[8] Bucolismo é o termo utilizado para designar uma espécie de poesia pastoral, que descreve a qualidade ou o carácter dos costumes rurais, exaltando as belezas da vida campestre e da natureza, característica do arcadismo. A base material do progresso consubstanciava-se nas cidades. Mudava o mundo, modernizavam-se as cidades e, consequentemente, redobravam os problemas dos conglomerados urbanos. A natureza acenava com a ordem nos prados e nos campos, os indivíduos resgatavam sentimentos corroídos pelo progresso. Os árcades buscavam uma vida simples, bucólica, longe do burburinho citadino.
[9] Epicurismo é o sistema filosófico ensinado por Epicuro de Samos, filósofo ateniense do século IV a.C., e seguido depois por outros filósofos, chamados epicuristas.
[10] O estoicismo é uma doutrina filosófica fundada por Zenão de Cítio, que afirma que todo o universo é corpóreo e governado por um Logos divino (noção que os estóicos tomam de Heráclito e desenvolvem). A alma está identificada com este princípio divino, como parte de um todo ao qual pertence. Este logos (ou razão universal) ordena todas as coisas: tudo surge a partir dele e de acordo com ele, graças a ele o mundo é um kosmos (termo que em grego significa “harmonia”). O estoicismo propõe viver de acordo com a lei racional da natureza e aconselha a indiferença (apathea) em relação a tudo que é externo ao ser. O homem sábio obedece à lei natural reconhecendo-se como uma peça na grande ordem e propósito do universo, devendo assim manter a serenidade perante as tragédias e coisas boas
[11] José de Sousa Saramago (Azinhaga, Golegã, 16 de Novembro de 1922 — Tías, Lanzarote, 18 de Junho de 2010) foi um escritor, argumentista, jornalista, dramaturgo, contista, romancista e poeta português. Foi galardoado com o Nobel de Literatura de 1998. Também ganhou o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa. Saramago foi considerado o responsável pelo efectivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa
[12] A metafísica (do grego antigo psTa [metà] = depois de, além de; e $uaiç (physis) = natureza ou física) é uma das disciplinas fundamentais da filosofia. Os sistemas metafísicos, na sua forma clássica, tratam de problemas centrais da filosofia teórica: são tentativas de descrever os fundamentos, as condições, as leis, a estrutura básica, as causas ou princípios primeiros, bem como o sentido e a finalidade da realidade como um todo, isto é, dos seres em geral.
[13] A Astrologia (do grego astron, “astros”, “estrelas”, “corpos celestes”, e logos, “palavra”, “estudo”) é a pseudociência segundo a qual as posições relativas dos corpos celestes podem, hipoteticamente, prover informação sobre a personalidade, as relações humanas, e outros assuntos mundanos. É, como tal, uma actividade divinatória, quando usada como oráculo, mas também pode ser usada como ferramenta para definição das personalidades humanas. Jung nos seus estudos chamava a este conceito de sincronicidade.
[14] José Castellani médico, escritor e historiador, é autor de mais de sessenta livros sobre a cultura maçónica, sendo considerado assim, um fenómeno na ampla literatura da Fraternidade. O seu primeiro livro foi lançado em 1973, sob o título ‘Os Maçons que fizeram a História do Brasil’. Além desta importante obra, José Castellani também é autor dos livros ‘Shemá Israel’, ‘A Ciência Maçónica e as Antigas Civilizações’, ‘A Maçonaria na Década da Abolição e da República’, entre outros. Portador de diversas condecorações por sua contribuição à cultura maçónica, destacando-se a Ordre Militaire et Hospitallier de Saint Lazare de Jerusalém (França) e a Ordo Sancti Georgi (Itália). Desde então, somou mais de sessenta títulos culturais maçónicos, tendo sempre no ‘forno’, novos títulos a serem publicados. Incansável trabalhador em prol da Educação e Cultura Maçónicas ocupou os mais altos postos da Ordem, nesta área, em São Paulo e no Brasil; criando e reformulando o pensamento e as atitudes de uma época e influenciando toda uma geração com a sua forma de agir e pensar
[15] A Rosa-Cruz é uma Fraternidade que foi publicamente conhecida no século XVII através de três manifestos e insere-se na tradição esotérica ocidental. Esta Fraternidade hermética é vista por muitos Rosacrucianistas antigos e modernos como um “Colégio de Invisíveis” nos mundos internos, formado por grandes Adeptos, com o intuito de prestar auxílio à evolução espiritual da humanidade. Por um lado, alguns metafísicos consideram que a Fraternidade Rosa-Cruz pode ser compreendida, de um ponto de vista mais amplo, como parte, ou inclusive a fonte, da corrente de pensamento hermético-cristã patente no período dos tratados ocidentais de alquimia que se segue à publicação de A Divina Comédia de Dante (1308-1321). Por outro lado, alguns historiadores sugerem a sua origem num grupo de protestantes alemães, entre os anos de 1607 e 1616, quando três textos anónimos foram elaborados e lançados na Europa: Fama Fraternitatis R. C., Confessio Fraternitatis Rosae Crucis e Núpcias Alquímicas de Christian Rozenkreuz Ano 1459. A influência destes textos foi tão grande que a historiadora Frances Yates denominou este período do século XVII como o período do Iluminismo Rosa-Cruz.
[16] Ordens iniciáticas são sociedades ou fraternidades, geralmente místicas e/ou filosóficas, que usam um sistema de graus para identificar a evolução didáctica dos seus membros em relação aos estudos geralmente ligados à metafísica.
[17] Nascido em Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, em 10 de Agosto de 1912, ainda menino, mudou-se com os pais para os Estados Unidos, onde completou os seus estudos básicos. Regressando ao Brasil, aqui formou-se em Contabilidade, especializando-se em administração financeira. Voltou aos Estados Unidos em duas oportunidades para completar estudos intensivos de administração na Marquette University em Madison – Wisconsin. Ocupou cargos de administração e de direcção em empresas como a General Motors Acceptance Corporation, Companhia Goodyear do Brasil, Companhia Auto-Lux (Rio de Janeiro), Brastemp, Willys Financeira, Ford Motors Company, Halles Financeira. Já aposentado, prestou serviços de assessoria ao Grupo Procil. Fez estágios em estabelecimentos bancários de Londres e Rotterdam. Participou da delegação brasileira junto ao Congresso da Eurofinas em 1973, em Montpellier – França. Ministrou diversos cursos de administração financeira no Management Center do Brasil. Foi comendador no grau de Gran Cruz da Ordem de San Giorgio de Carinzia (Itália), Medalha e Comenda “Ana Néri” da Sociedade Brasileira de Educação e Integração.
[18] Miguel Primo de Rivera y Orbaneja, Marquês de Estella e de Ajdir (Jerez de la Frontera, 8 de Janeiro de 1870 — Paris, 16 de Março de 1930) foi um militar e ditador espanhol, fundador da organização fascista Unión Patriótica, inspiradora da União Nacional portuguesa.
[19] Alfredo Margarido (Moimenta, 5 de Fevereiro de 1928-Lisboa, 12 de Outubro de 2010) foi um escritor, ensaísta, investigador, professor universitário, poeta e pintor português.
Bibliografia
- BONDARIK, R. Fernando Pessoa: Uma Apologia da Maçonaria http://www.maconaria.net/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=79
- Reflexões de Fernando Pessoa sobre a Maçonaria Cristã. http://www.daemon.com.br/wiki/index.php?title=Reflex%C3%B5es de Fernando P essoa_sobre_a_Ma%C3%A7onaria_Crist%C3%A3
- WIKIPEDIA. Fernando Pessoa. http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa
Fonte: Texto gentilmente cedido por Freemason.PT para o site Firmeza.org.br