A Inconfidência Mineira e sua Relação com a Maçonaria: Mitos e Realidades

A história da Inconfidência Mineira é repleta de mistérios e controvérsias, especialmente quando se trata da possível influência da Maçonaria nesse movimento de libertação que se desenrolou na Capitania das Minas Gerais. Desde as origens até a autoria, os debates entre historiadores renomados têm sido intensos, muitas vezes marcados por visões antagônicas e acusações de parcialidade.

A questão central que surge é se a Conjuração Mineira foi, de fato, um movimento maçônico, como alguns afirmam, ou se essa afirmação carece de embasamento histórico, conforme argumentam outros estudiosos. Os documentos oficiais, especialmente os “Autos da Inconfidência Mineira”, são frequentemente citados como base para os estudos sobre o tema. No entanto, é importante considerar que esses autos foram promovidos pelo regime colonial opressor de Portugal, o que lança dúvidas sobre a imparcialidade e veracidade dos relatos ali registrados.

“O documento básico no qual todos os historiadores têm se baseado são os “Autos da Inconfidência Mineira”, porém convém não esquecer que quem tinha o poder na época do processo dos Inconfidentes era o Portugal opressor.”

Frederico Guilherme da Costa- Questões controvertidas da Arte Real- pág. 37.

A Maçonaria, na época, era uma sociedade secreta e clandestina, proibida tanto no Brasil quanto em Portugal. Suas reuniões e atividades ocorriam sob sigilo, muitas vezes disfarçadas como encontros literários ou familiares. A perseguição aos membros da Maçonaria era implacável, e o simples fato de pertencer a essa ordem era considerado criminoso.

É nesse contexto de clandestinidade e opressão que surgem as especulações sobre a participação da Maçonaria na Inconfidência Mineira. Alguns historiadores argumentam que líderes do movimento, como Tomaz Antônio Gonzaga e José Álvares Maciel, estabeleceram sociedades literárias que serviram como fachada para as atividades maçônicas e para a disseminação das ideias de liberdade e igualdade.

Essas sociedades, embora não fossem formalmente reconhecidas como Lojas Maçônicas, desempenharam um papel crucial na preparação e organização da rebelião. É sugerido que, por meio desses grupos, os ideais iluministas, comuns entre os maçons, foram difundidos e debatidos, alimentando o desejo de emancipação do Brasil.

A figura de José Álvares Maciel é particularmente destacada nesse contexto. Estudante na Europa, onde provavelmente foi iniciado na Maçonaria, Maciel retornou ao Brasil com ideias de liberdade e fraternidade, influenciado pelo ambiente intelectual das Lojas Maçônicas europeias. Sua atuação na organização de sociedades secretas em Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo é citada como evidência da presença maçônica na preparação da Inconfidência.

“Assim vem sendo balburdiada a história da conjuração mineira. Nesse tumultuar, há o propósito de falsear, de baralhar para confundir, para ludibriar, para ocultar que a conjuração mineira foi um movimento maçônico, idealizado por maçons brasileiros que estudavam no estrangeiro, onde se iniciaram e que procuraram o apoio de um país – os Estados Unidos – cujo governo era integrado por maçons, isto é, por irmãos, e solicitaram a intercessão de irmão norte-americano , Thomas Jefferson, sabidamente maçom, pois que frequentava lojas na França, a exemplo do que fizera Benjamim Franklin.”

A. Tenório D’Albuquerque – A Maçonaria e a Inconfidência Mineira – pág. 19.

Este episódio do pedido de ajuda aos EUA, mencionado anteriormente, remete ao encontro de José Joaquim Maia, um estudante brasileiro em Montpellier, que procurou o Dr. Vigarous, um maçom ativo e respeitado, para facilitar um encontro com Thomas Jefferson em Paris. Embora não esteja documentado que Jefferson tenha agido em resposta ao pedido de intercessão, é possível que ele tenha sugerido contatos com comerciantes franceses para auxiliar o movimento de alguma forma.

“…Devidamente autorizado e informado, Maia procura o professor Vigarous, eminente médico e membro da Loja Maçônica local subordinada ao Grande Oriente da França, cujo filho era seu colega na Faculdade de Medicina, relatando-lhe os planos e solicitando apoio para um contato com o representante em Paris dos Estados Unidos da América. Os documentos não nos autorizam afirmar que o criptônimo VENDEK foi sugerido pelo Professor Vigarous ou se “era na realidade o nome de um comerciante francês estabelecido no Rio de Janeiro”…

José Castellani e Frederico Guilherme Costa – A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não houve

Além de Maciel, outros nomes são mencionados como possíveis maçons envolvidos no movimento, como Domingos Vidal Barbosa e José Joaquim da Maia. A influência da Maçonaria na disseminação de ideais revolucionários, como Liberdade, Igualdade e Fraternidade, é ressaltada como um dos pilares da Inconfidência Mineira e defendida por alguns autores.

“É inadmissível considerar a Inconfidência Mineira apenas no seu momento, quando da descoberta. Cumpre pesquisar as suas origens e reconhecer tratar-se de um movimento libertador do Brasil desopressor dos mineiros vilmente explorados pela cobiça insaciável da metrópole, movimento com indiscutível influência das idéias oriundas da França, dos enciclopedistas, que eram Maçons, arrancada para a liberdade, dirigida por maçons brasileiros e debatida e planejada em sessões maçônicas”

A. Tenório D’Albuquerque – A Maçonaria e a Inconfidência Mineira – pág. 20

No entanto, é importante reconhecer as limitações e desafios na investigação desse período histórico. A falta de documentação específica que comprove a participação da Maçonaria, assim como a manipulação dos registros oficiais pelas autoridades coloniais, dificulta uma análise conclusiva sobre o papel da ordem na conjuração.

Apesar das incertezas, não se pode ignorar a importância das ideias e valores propagados pela Maçonaria durante o período colonial brasileiro. A busca pela liberdade, pela dignidade humana e pela justiça social estava intrinsicamente ligada aos ideais maçônicos, e é provável que esses princípios tenham influenciado os líderes da Inconfidência Mineira em sua luta contra o domínio opressor de Portugal.

A relação entre a Maçonaria e a Inconfidência Mineira continua sendo objeto de debate e pesquisa, refletindo não apenas sobre o passado histórico do Brasil, mas também sobre os valores e ideais que moldaram a luta pela independência e pela justiça ao longo dos séculos.

Independentemente da falta de comprovação documental conclusiva, é crucial reconhecer que o movimento pela liberdade, igualdade e fraternidade não deve ser esquecido. Esses ideais, tão enraizados na história da Inconfidência Mineira, continuam a ressoar nos dias atuais como princípios fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e democrática.

Neste sentido, a sociedade contemporânea deve se lembrar e se inspirar nas aspirações dos inconfidentes, que lutaram corajosamente contra a opressão e pela autodeterminação do povo brasileiro. A busca pela liberdade individual e coletiva, pela igualdade de direitos e oportunidades, e pela fraternidade entre todos os cidadãos permanece como um ideal a ser perseguido e realizado.

Mais do que simplesmente recontar os eventos históricos, é importante refletir sobre os valores e princípios que motivaram a Inconfidência Mineira, incorporando-os em nossas próprias ações e lutas por um mundo mais justo e humano.

Ao honrar a memória dos inconfidentes e seus ideais, fortalecemos o compromisso com a construção de uma sociedade verdadeiramente livre, igualitária e fraterna para as gerações presentes e futuras.

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